7 mars 2007

OPA contra a PT

OPA’s bufas…

O fim-de-semana ficou marcado pelo fim da gigantesca operação de marketing da Sonae, em torno da OPA sobre a PT. Depois de tanto ruído, é caso para dizer que a montanha pariu um rato. Foi o final infeliz, para Belmiro de Azevedo e o seu séquito de serviçais e “fazedores-de-opinião” que alimentavam, há mais de um ano, esta autêntica telenovela da série C – um género de ópera bufa que massacrava todos os dias os telespectadores. E agora? Será que a pátria ruiu ou a Terra deixou de girar em torno do Sol, como sugerem alguns comentadores de serviço?
Terramoto apenas se registou na bolsa, com as acções da Sonaecom a caírem mais de 16% e a própria PT a registar uma baixa superior a 3%, num jogo de soma negativa em que todos parecem sair a perder, numa semana de queda generalizada das bolsas europeias e mundiais. Repare: em dois ou três dias não se criou nem se perdeu nenhum valor acrescentado nestas empresas, muito menos em resultado de investimentos no sector das telecomunicações e da informação. Mas a Sonaecom desceu já 16,5% e a PT 3, 03%.
Este fenómeno é característico da economia de casino em que assenta a ditadura financeira mundial, abalada de tempos a tempos pelo rebentamento duma das suas bolhas especulativas – do imobiliário aos preços dos combustíveis ou à chamada economia virtual – que podem ruir como um castelo de cartas, arrastando países e continentes inteiros para a crise e a depressão. Foi assim na crise mexicana dos anos 80, na asiática dos anos 90 e na Argentina, já em pleno século XXI, com estilhaços à escala global.
No caso vertente desta OPA sobre PT, estávamos perante uma operação especulativa de contornos escandalosos. Com 16 mil milhões de euros emprestados, a Sonae faria um “negócio da China”, reembolsável num prazo bastante curto: 5 mil milhões seriam realizados na venda de partes da PT, nomeadamente da sua rede fixa; a segurança social cobriria o défice de 3 mil milhões do fundo de pensões da empresa; e restava cerca de metade do capital, amortizável com o lucro anual da PT – cerca de 500 milhões de euros – e com isenções fiscais de 400 milhões de euros/ano.
No final, Belmiro lucraria mais 6 mil milhões de euros sem investir verdadeiramente um cêntimo; e o banco que financiasse o negócio teria assegurado 800 milhões de juros por ano, durante mais de uma década. Mas, como em qualquer lotaria, a taluda sai a poucos e a esmagadora maioria perde: neste caso perderiam os consumidores, com o aumento de preços resultante da concentração das telecomunicações, em especial da TMN e da Optimus na rede móvel; perderiam, obviamente, os trabalhadores da PT, com mais de 3 mil despedimentos garantidos e, por isso, com boas razões para festejar o fiasco da OPA – e mais razões ainda para continuarem a lutar contra os despedimentos que estão na forja da administração de Henrique Granadeiro, sob a tutela do BES.
No rescaldo da assembleia de accionistas da PT, foi curioso verificar a surpresa de Ricardo Salgado perante o alinhamento da Sonae com a Telefónica espanhola, que quebrou o seu estranho silêncio. Afinal, parece que o capitão-mor do capitalismo nacional, Belmiro de Azevedo, estava feito com os castelhanos... Que dirão os delfins do “Manifesto Portugal”, defensores de um “núcleo duro” do capitalismo nacional? Quem é Ricardo Salgado para se escandalizar com estas jogadas, em tempos de globalização? E, já agora, quais serão as cenas do próximos capítulos?
Depois da OPA abortada, não há razões para trabalhadores e consumidores dormirem descansados. Há muito que caiu o mito da PT como empresa pública e, sobretudo, da empresa de serviço público. O abuso da posição monopolista que continua a ter no mercado das telecomunicações serve, aliás, de pretexto para os cantos de sereia desta e de futuras OPA’s. Exemplo: um assinante da Internet de banda larga paga à Telepac (PT) cerca de 35 euros por mês e encontra um preço mais favorável na concorrência; ao comunicar que quer desistir da assinatura, a Telepac, para o segurar, propõe-lhe baixar de imediato para 22 euros; caso contrário, continuaria a pagar os mesmos 35 euros. É este universo especulativo de assalto ao consumidor que engorda a PT, a Sonaecom e quejandas.
No Portugal socrático e do “Apito Dourado”, as OPA’s são a “marca da modernidade” transgénica: a Autoridade da Concorrência deu também luz verde à OPA do BCP sobre o BPI e o mercado agita-se com a recentíssima OPA de Paulo Portas sobre o CDS-PP…

Alberto MatosCrónica semanal na Rádio Pax – 06/03/2007

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