11 oct. 2007

Zone libre d'OGM

OGM – Não, obrigado!

A “acção directa” de dezenas de apoiantes do movimento “Verde Eufémia” contra a plantação de milho transgénico, no concelho de Silves, trouxe à luz da opinião pública portuguesa, com o tradicional atraso, um problema que mobiliza cidadãos e governos de vários países e continentes. A direita política e ideológica, naturalmente, colocou a defesa da “sacrossanta” propriedade privada acima de tudo, como se a propriedade – ainda por cima dum bem finito como é a terra – não devesse estar subordinada à função social que ela desempenha… ou deveria desempenhar.

O governo Sócrates e o seu ministro da Agricultura, Jaime Silva, afinam pelo mesmo diapasão. Na ânsia de mostrar serviço, apressaram-se a colar a acção do “Verde Eufémia” um rótulo partidário – o que, além de manipulador, é manifestamente falso e redutor. Independentemente das apreciações sobre o alvo escolhido, a forma e os meios utilizados que têm a marca própria dos promotores, é óbvio que a direita e o “centrão” querem sobretudo evitar uma discussão séria e aprofundada sobre os transgénicos, não apenas do ponto de vista ambiental e da saúde pública, mas também em termos de autodeterminação dos produtores agrícolas e de soberania alimentar.

Entretanto, pela calada, os OGM vão ganhando espaço, impõem-se como facto consumado e podem vir a transformar-se numa verdadeira praga. A Direcção-Geral de Agricultura e Desenvolvimento Rural anotou a existência em Portugal de 163 explorações de milho transgénico, num total de 4200 hectares. A área de cultivo de OGM quadruplicou entre 2006 e 2007, tendo o Alentejo uma triste liderança deste tipo de culturas, com quase 2400 hectares de milho geneticamente modificado.

No recente debate sobre Alqueva, realizado em Moura, com base na experiência de luta do MST no Brasil, Alípio de Freitas denunciou os transgénicos, “como um assalto ao património de todos os povos que desenvolveram sementes ao longo dos tempos. Mais: “com os transgénicos, as sementes guardadas não se reproduzem; é preciso comprá-las todos os anos, em ‘kits’ que incluem herbicidas e insecticidas exclusivos”. As transnacionais do sector monopolizam as produções e vendem a preços baixíssimos, arruinando os produtores tradicionais do terceiro mundo – um efeito paradoxal para quem se propõe acabar com a fome. Além disso, como os transgénicas quase não requerem mão-de-obra e pagam “imposto” ao dono da patente, colocam os agricultores e os países na sua progressiva dependência – caso das plantações de soja no Brasil.

Não é impunemente que, em Maio deste ano, o governo alemão baniu a venda para sementeira do milho “Mon 810”, até então autorizado. Ao exigir à empresa comercializadora – Monsanto – um plano de monitorização e impacto ambiental, o governo alemão congelou de facto as novas culturas OGM. A 21 de Setembro o ministro do ambiente francês declarou que, não sendo possível controlar a disseminação de OGM é inadmissível correr riscos, congelando a venda de sementes OGM. A França pode juntar-se à Alemanha, Polónia, Áustria e Grécia e Hungria, no conjunto dos países europeus que baniram o cultivo de sementes transgénicas.

É este princípio da precaução que orienta o projecto de Resolução apresentado pelo BE na AR, propondo uma moratória de três anos sobre o cultivo de sementes que contendo OGM. A precaução justifica-se plenamente, dada a permissividade do governo Sócrates: ao autorizar a plantação de milho transgénico em Silves, nos termos da Portaria 904/2006, o Ministério da Agricultura desprezou diversas assembleias municipais da região e a própria Assembleia Metropolitana que tinha declarado o Algarve “zona livre de OGM”, em Abril de 2007.

No Alentejo, a mesma atitude de precaução impõe-nos seguir os bons exemplos. Há pelo menos um concelho – Odemira – cuja Assembleia Municipal já se declarou como “zona livre de transgénicos”; resta saber se esta declaração é respeitada na vasta área de regadio da barragem de Santa Clara. Por maioria de razão, na zona de influência de Alqueva e nos perímetros de rega do Alentejo, impõe-se que as autarquias promovam uma discussão pública participada sobre os OGM, capaz de mobilizar os mais diversos sectores: escolas, profissionais de saúde, agricultores, ambientalistas, etc.

De imediato, devem ser identificadas as explorações agrícolas que já utilizam OGM, sendo as suas consequências estudadas e monitorizadas. Na conclusão deste vasto processo de maturação cívica e ambiental, cada assembleia municipal deverá pronunciar-se sobre o cultivo de OGM; e, se for essa a vontade dos órgãos deliberativos dos 47 municípios, o Alentejo declarar-se-á “zona livre de transgénicos”. A experiência do Algarve mostra que só um processo participativo de grande envergadura poderá tornar esta declaração efectiva e não meramente simbólica, forçando o governo a revogar absurdos legislativos com a portaria 904/2006.

Queremos o ALENTEJO LIVRE DE TRANSGÉNICOS. Para valer e antes que seja tarde!



Alberto Matos – Crónica semanal na Rádio Pax – 09/10/2007

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